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O isolamento social causado pela crise do coronavírus trouxe uma nova forma de estar no mundo: a aproximação virtual. Como consequência da pandemia, as relações interpessoais, profissionais e dos sujeitos entre si ganharam diferentes rumos. Antes presenciais, diversas dinâmicas se transformaram em rotinas online graças às possibilidades digitais disponíveis.

A cultura não foge à essa realidade. Assim como escolas, faculdades e empresas se adaptaram ao mundo remoto, a arte e o entretenimento também descobriram formas de se fazer presente em um contexto social nunca antes visto. Desse modo, a produção e o consumo de arte se alteraram para se encaixar nessa nova dinâmica, configurando uma nova maneira de acesso à cultura. 

Do físico ao virtual

TÍTULO SEGUNDA RETRANCA 

Representada no modo de falar, gostar, ser ou agir, cultura é tudo aquilo que resulta da ação humana. De movimentos culturais até preferências individuais, essas expressões fazem com que o agrupamento de pessoas, também chamado de sociedade, faça sentido. Dessa forma, levando em consideração que as produções culturais são importantes para dar sentimento de pertencimento, como fica a relação entre a oferta de arte e o público receptor durante a quarentena? 

Sancionado pelo governador Ibaneis Rocha, o decreto do GDF n° 40.539/2020 suspendeu o funcionamento de shoppings, museus, teatros, cinemas, casas noturnas e estabelecimentos em geral. Isolada em casa e sem ter para onde ir, boa parte da população tornou as redes sociais um ponto de refúgio. Seguindo essa lógica, a produção e o consumo de cultura estão passando por um processo de reinvenção para se adequar aos novos modelos de vida impostos pela pandemia. 

Em virtude dos inúmeros cortes e ameaças sofridas pelo governo Bolsonaro, artistas já vinham buscando novas formas de se fazer presente. Dentro desse cenário, o vírus foi só mais um fator de resistência e motivo de reformulação na maneira com que se produz e se consome produtos artísticos e de entretenimento. Vivendo em isolamento social, artistas estão adaptando shows, que antes eram presenciais, para se adequar às lives em plataformas online, com o intuito de se conectar remotamente ao público e contribuir com doações para combater o Covid-19. 

O mesmo acontece para o público-alvo dessas atrações, que está isolada em casa devido a quarentena. Em vez de as pessoas irem aos shows, peças teatrais ou festivais, agora esses eventos vão até elas. De casa, só é preciso ter um aparelho com conexão à internet e pronto: um mundo de possibilidades culturais, artísticas e de entretenimento ficam disponíveis na palma da mão. 

Se vista com otimismo, essa adaptação é até um sinal de esperança para a classe dos artistas. Isso é o que pensa Amanda Maia (21), que ganha a vida cantando profissionalmente em bares há 6 anos e foi uma das que aderiu às apresentações por lives no Instagram. Segundo ela, essa experiência pode ser usada de exemplo para que a arte seja mais valorizada, já que vem sendo uma das maiores ferramentas de consolo psicológico durante o confinamento originado pela pandemia.

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Quanto a distração do público ser realmente o objetivo principal, a cantora afirma que 

 

“O intuito das lives é mitigado, não é só a distração. Tem o fator distrair as pessoas, tem o fator distrair o próprio músico, tem a questão da sanidade mental do artista e tem a questão da arrecadação”. 

 

Para os artistas locais e trabalhadores informais, que segundo uma pesquisa de 2018 feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) representam cerca de 41,3% dos 93,6 milhões de trabalhadores do Brasil, o termo “arrecadação” se refere ao valor que paga as contas familiares no final do mês. Amanda conta que, em meio a crise, o valor gerado equivale à apenas 10% do que conseguia antes, se apresentando em ambientes físicos. 

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Essas adaptações no cenário cultural refletiram em impactos positivos para o público consumidor de conteúdos. Para Gabriela Terto (19), vestibulanda do curso de Medicina, as transmissões ao vivo ajudam a não se sentir tão confinada, já que estamos o tempo todo em casa. “Acaba que desvia a mente dessa loucura toda que está acontecendo no mundo, é um bom escape. Além disso, tem lives de artistas que provavelmente eu não teria oportunidade de ir em shows ao vivo e posso ter a experiência de casa mesmo”, comenta.

Entretanto, mesmo se mostrando essencial para os dias de isolamento, sendo uma boa maneira de se divertir, a estudante alega que “uma live não substitui o calor e a emoção que é ver o artista de pertinho, o som alto e todo mundo cantando e dançando junto. É uma sensação insubstituível”.

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Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), dados de 2017 comprovam que o Brasil é o país com o maior número de pessoas que sofrem com transtorno de ansiedade, sendo esses 9,3% da população. A psicóloga Vivian Vasconcelos (24), garante que essas novas formas de produção e acesso à cultura vêm sendo um grande amparo para a saúde mental da população, ocupando um papel de distração e entretenimento e substituindo, mesmo que momentaneamente, sentimentos como preocupação, ansiedade e estresse.

Atribuído ao fato de a população estar isolada em suas casas, com mais tempo de ócio e incertezas sobre o futuro, Vivian afirma ter percebido um aumento na procura por acompanhamento psicológico durante esse período. 

Gabriella Rodrigues assistindo a live da Ivete Sangalo

Além de funcionar como válvula de es-

cape, outro fator deve ser observado.

“A cultura, e nisso a gente fala de músicas, filmes, enfim, vem como uma válvula de escape que tira o foco dessas pessoas ansiosas dessa preocupação delas. Ela leva o foco para aquilo que distrai, que traz  uma sensação de bem estar, uma sensação de prazer. Então é uma coisa muito positiva, não só pra quem tem ansiedade, mas para qualquer outro tipo de transtorno”.

Do cinema ao streaming

Quando o assunto é cinema, é quase impossível não pensar na ascensão que os serviços de streaming estão atingindo no contexto atual. Segundo estudo da Ampere Analysis, esses serviços vão faturar mais que as bilheterias de cinema em todo o mundo neste ano. Empresas como Netflix e Amazon Prime Video pretendem arrecadar US$ 46 bilhões, representando US$ 6 bilhões a mais do que a indústria do cinema, o que pode dar uma dimensão do crescimento dessas plataformas.

Com o fechamento do comércio decretado pelo GDF, é de se imaginar que haverá prejuízos econômicos para essa parcela de pessoas que depende do movimento das produções cinematográficas. Dessa forma, as plataformas que oferecem conteúdo e entretenimento online presenciam uma ótima oportunidade de mercado no Brasil, tendo em vista que, de acordo com um estudo chamado The State of Mobile 2019, o país é o segundo do mundo em horas gastas com streaming, perdendo apenas para a Índia.

Importante também destacar que os prejuízos acontecerão de formas e intensidades diferentes, considerando os pequenos e grandes produtores. É o que pensa Josiane Diniz, professora do curso de cinema do Iesb, formada em comunicação social com habilitação em audiovisual pela Universidade de Brasília (UnB). Atualmente, ela é doutoranda da UnB e pesquisa sobre o cinema periférico do Distrito Federal. “Para os grandes produtores talvez não tenha tanto peso a longo prazo, pois a crise para eles será mais contornável do que para as pequenas empresas”, revela. 

A professora também levanta o aspecto de que muitos editais que normalmente ajudam esses produtores audiovisuais foram paralisados. Festivais de cinema também foram cancelados por conta do isolamento, afetando ainda mais as empresas menores. De acordo com a professora, estas empresas dependem de uma demanda constante, mas acredita que os prejuízos poderão ser contornados no futuro. “O isolamento durando até junho ou julho, como dizem as previsões até agora, acredito que essa crise será contornada”, diz.

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Página inicial da plataforma de streaming Netflix

No momento, ir ao cinema não é uma opção de saída. Logo, os serviços de distribuição de conteúdo audiovisual parecem tomar proporções ainda maiores. São um refúgio para aqueles que gostariam de assistir um filme ou uma série no momento que quiserem. 

Sobre a diferença existente entre ir ao cinema e assistir a um filme em casa, Josiane pensa que os streamings não são capazes de substituir o que uma sala de cinema proporciona. As duas situações têm suas vantagens e desvantagens. Mas também levanta o fato de que o ingresso do cinema hoje em dia ser caro e, se botar na balança, assinar um serviço de streaming compensa mais no quesito econômico.

O que não quer dizer que um seja melhor ou pior. “Da mesma forma que passar uma partida de futebol na TV não substitui a ida ao estádio, o streaming não substitui a ida ao

cinema”, complementa. Josiane Diniz também ressalta que em Brasília existe o Cine Brasília, uma opção de cinema que 

não é dentro de um shopping, e que possui um preço acessível. Porém, entende que a realidade da maior parte dos brasilienses é ter de ir ao shopping para acessar o cinema, onde os preços tendem a ser maiores.

Em relação aos serviços de streaming disponíveis, o estudante de jornalismo Felipe Dourado (23), comenta que a disponibilidade de conteúdos online oferece maior liberdade de escolha ao cliente. Ao contrário de assistir um filme selecionado por outra pessoa em um canal de televisão, plataformas como Netflix democratizam o acesso ao entretenimento “por ser muito amplo para todo mundo”. Para ele, quanto mais opções o cliente têm, maior o nível de satisfação. 

A estudante de Letras Gabriella Rodrigues (20), diz que praticamente não acompanhava esses serviços antes da quarentena. “As séries, novelas e a televisão em geral não cabiam na minha rotina”. Entretanto, a nova forma de vida alterou essa realidade, e hoje ela preenche boa parte do tempo acompanhando filmes e séries nas plataformas online.

“Acredito que os serviços de streaming são muito importantes nesse momento, levando em consideração que muitas pessoas, incluindo eu, ficam ansiosas e tentam mudar o foco de seu pensamento. Quando não temos para onde fugir, levamos nossos pensamentos para as histórias fictícias para esquecer a realidade catastrófica que nos cerca”, conta a estudante. 

A professora do curso de cinema do Iesb, Josiane Diniz, também deixa um conselho para aqueles que estão cumprindo a quarentena em casa.

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“Todos nós tínhamos planos antes da quarentena, que de uma hora pra outra precisaram ser adiados ou cancelados. A primeira coisa a ser feita é aceitar a situação atual, que você vai deixar de fazer várias coisas, e que tudo bem nossos planos serem adiados”, aconselha. 

Para ela, a quarentena também é uma oportunidade para fazer coisas que normalmente as pessoas não teriam tempo, ou teriam resistência em tentar. “Temos que nos perguntar: como posso aproveitar esse momento de uma forma bacana? E a resposta vai depender de cada pessoa, se pra você é ler livros, ou maratonar filmes e séries, tudo bem”.

ESCRITO POR:

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19 anos, estudante de jornalismo, curte MPB (de Caetano a MC Livinho) e assiste sempre os mesmos filmes de romance clichê.

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19 anos, estudante de jornalismo, amante da sétima arte e livros de todos os gêneros.

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21 anos, estudante de jornalismo, viciada em animes, apaixonada por Harry Potter e fã de K-Pop nas horas vagas.

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Print da live do artista Cícero Rosa feita no Instagram 

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